sábado, outubro 07, 2006

Semana Cultural: Os Caminhos da Doutrinação

Nota da Carta Liberal: A Semana Cultural foi 4 dias de palestras com palestrantes escolhidos a dedo pela Área de Sociedade e Cultura do CEFET-SP, tradicional escola da zona norte de São Paulo. Esperamos que com esse artigo responda ao questionamento do internauta Leonardo. (Pela imagem já podíamos imaginar o que viria pela frente!)

O ensino será ministrado com base nos princípios da liberdade – de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber – e do pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas.

Constituição Federal, art. 206, II e III

Como diria o ditado, de boas intenções o inferno está cheio. A idéia de criar uma Semana de Arte Cultural com enfoque na América Latina é extraordinária. Conhecer quem está tão perto de nós, mas sobre os quais pouco sabemos é uma idéia um tanto quanto interessante e empolgante. Mas ao término da semana que conclusões pudemos tirar sobre ela?

A palestra com o senhor Alejandro, do Exército Zapatista de Libertação Nacional foi uma das maiores demonstrações da doutrinação ideológica. Não simplesmente por sua exposição. Alejandro mostrou seu ponto de vista, o de alguém que já fez parte de tal movimento. Fez duras críticas ao governo mexicano e, entre muitas outras coisas, o famoso e popular imperialismo norte-americano e o demônio do Bush. O problema não está aí. Está no fato de que tudo isso ficou sem resposta. Se houvesse uma outra palestra mostrando o outro lado da história ou, melhor ainda, um debate entre duas pessoas com visões opostas, seria bem diferente, bem mais próximo do ideal. Mas da forma como foi feito, Alejandro e EZLN passam a ser vistos como os salvadores da pátria e donos da verdade, a única opinião possível e aceitável. E até agora há quem se pergunte se ele foi apresentar um tema ou vender livros.

Os filmes não podiam deixar de dar mais um passo para a doutrinação. Exemplos como “A Revolução Não Será Televisionada”, “Machuca” e “Diário de Motocicleta” ajudam a dar uma idéia de quão lamentável foi a semana. É uma pena que esse tipo de prática seja tão comum numa escola que tenha um potencial tão grande, tanto por parte dos professores quanto dos alunos. Essa capacidade dos professores torna a situação mais grave ainda, pois é uma prova de que é feito conscientemente. Lástima.

Porém, o pior momento das atividades culturais ainda estava por vir. Foi convidado um grande sociólogo brasileiro, senhor Chico de Oliveira. Durante sua exposição, tentou levar a palestra da melhor maneira possível. Todos atentos e gratos por estarem vendo um grande intelectual brasileiro. Até que chega um sujeito fazendo barulho com toda altivez. Já dava para ver que boa coisa não sairia dali. Depois de algumas perguntas da platéia, o indivíduo pede para tomar a palavra. E a partir daí não preciso dizer mais nada. Poucos foram os que não se indignaram. Uma invasão. Chega a ser nojento o ocorrido. Diante de um profissional sério, aparece alguém que não sabíamos se era um professor ou um comediante (de péssimas piadas, por sinal).

Mas, ainda assim, foi possível encontrar um ponto alto nessa história toda. Os músicos foram brilhantes, muita gente que nunca tinha tido oportunidade de assistir música de qualidade ao vivo apreciou admirada às apresentações dos próprios alunos, “companheiros de trabalho”. Como diria Machado, “Dessa terra e desse estrume é que nasceu uma flor”. Essa flor foi a música. Mas, infelizmente, a única.

De fato, não era de se esperar imparcialidade (ao menos uma tentativa) numa escola que durante todo o ano doutrina seus alunos e não se envergonha por isso. Pelo contrário: gosta, aprova e até busca. E, pior ainda, os alunos gostam dos doutrinadores. Não há dúvida de que é uma variante da “síndrome de Estocolmo”, na qual se estabelece uma relação afetiva entre estudantes e seqüestradores intelectuais.

Que pena!

5 Comments:

At outubro 07, 2006, Anonymous Anônimo said...

Tudo esclarecido!!!Mas gostaria de frisar que mencionei na mensagem anterior ser "uma pena" a não existência de ideologias. Quando me referi a ideologias, quis dizer que seria muito bom que existissem diversas correntes de idéias e pensamentos nas escolas, para haver mais discussões e debates, ou seja, que nao houvesse apenas uma forma "dogmática" de pensar, mas varias, assim podendo haver confronto de idéias. Vocês defendem uma de idéia do qual realmente concordo, e sinceramente, tenho tido até muitos problemas, pois recentemente minha professora de história passou uma redação com o tema relacionado ao discurso do papa Bento XVI, em relação ao que disse a respeito de Maomé. O tema era: "É correto matar por Deus"; ela escolheu esse tema por causa das ameaças de atentado no Vaticano. Vale ressaltar que ela é católica. Nesse tema é claramente perceptível um posicionamento perante o tema, uma parcialidade, e acabei redigindo minha redação criticando-a pela escolha do tema, e pelo fato de não ter dado ênfase ao outro lado, ou seja,a negligência do papa, o que acarretou não só discussão minhas com a professora, mas também com os alunos(irremediavelmente apegados ao sistema)...Obrigado pela resposta, eu ainda tinha muitas opiniões a dizer mas vou parar por aqui, quando puder irei comentar sobre seus textos, os quais tenho achado bastante interessantes

Leonardo

 
At outubro 09, 2006, Blogger gio14vr said...

Oi...
passei para comentar de novo... Eu tbm não gostei da semana cultural. Eu concordo com vcs nesse ponto: o tema não foi visto por outros ângulos. A América Latina foi mostrada muito limitadamente...

 
At outubro 10, 2006, Anonymous Anônimo said...

Aposto que o sujeito arrogante (que não sabemos se é "professor" ou "comediante")que invadiu a palestra do Chico de Oliveira para contar "piadas sem-graças" também foi, há muito tempo atrás,como vós:jovens oposicionistas dedicados à denúncia de "seqüestros ideológicos" promovidos por "doutrinadores" que "estabelecem uma relação afetiva" com seus alunos "irremediavelmente apegados ao sistema".
Passam as gerações e mudam as ideologias dominantes, mas a "altivez" dos críticos ante aos "doutrinadores" permanece a mesma.

 
At outubro 10, 2006, Blogger Carta Liberal said...

Caro Anônimo,
O professor que invadiu a palestra não era nem um pouco apegado ao sistema. Fez propaganda política da Heloísa Helena, e segundo ele mesmo, votaria em operários de esquerda. Não somos oposicionistas. Nossa causa é a causa liberal e a liberdade de opinião (Prefiro os que me criticam, que me corrigem, aos que me adulam, que me corrompem) Sto. Agostinho. Portanto debatemos com argumentos e lógica. E não com fúria enraivecida e doutrinadora de extrema-esquerda.

 
At outubro 10, 2006, Blogger Carta Liberal said...

E para ficar bem claro: Defendemos o pluralismo de idéias nas escolas. Jamais a apresentação propositadamente parcial de determinados temas.O importante é que os alunos possam raciocinar. Mas, para isso, é preciso conhecer todos os lados, como expusemos no texto.
Claro que não esperamos perfeição e exatidão na imparcialidade, pois sabemos ser isso impossível. Entretato, a imparcialidade deve ser uma META.

 

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