Os Limites da Democracia
“Se os pobres votassem para que os bens dos ricos fossem distribuídos entre eles, não seria isso uma injustiça?” Aristóteles
O que é democracia? Um sistema onde as decisões tomadas pelo governo têm que passar pela aprovação da maioria da sociedade. Isso é, pelo menos em princípio. Na democracia clássica, aquela praticada em Atenas na Grécia antiga, todos os cidadãos têm direito a voto direto nas decisões tomadas pelo Estado; a democracia moderna se aproxima mais de uma república, onde a sociedade expressa seus interesses através de representantes eleitos.
O sistema democrático, especialmente o representativo, tem falhas inerentes a ele próprio, tanto quanto o ser humano tem falhas – trata-se de algo natural. Muitas ditaduras usaram o argumento de que uma democracia “não tem o poder de agir decisivamente” para ganhar o apoio do povo em momentos de necessidade. Na verdade, a democracia, ao dar a todos ao menos uma possibilidade de ação, tende a contrabalançar essas falhas naturais, onde uma ditadura tende a realçá-las, pois não há ninguém para se opor.
Assumimos hoje que a democracia é a melhor forma de governo que já foi testada. Até este ponto, as únicas pessoas que se irritaram ao ler este artigo foram aquelas que defendem um governo forte para “dar rumo” à sociedade. Mas não se aflijam – o objetivo aqui não é defender a democracia, mas discutir a frágil relação entre o poder popular e a liberdade individual.
É amplamente considerado, hoje em dia, que o fato de eleger um representante para atender aos interesses de um grupo é algo legítimo. Por exemplo: um grupo de cidadãos de uma cidade concordam em apoiar a candidatura de determinado vereador, sabendo que, se eleito, esse vereador vai fazer com que a máquina do Estado penda para o lado daquele grupo, através de leis. Esse é, sem dúvida, o princípio fundamental da democracia. Mas será que é só isso?
Como já foi lembrado muitas vezes anteriormente, o Estado não é uma entidade auto-suficiente – ela funciona com recursos tirados na marra daqueles que trabalham gerando riquezas. Esses trabalhadores, empresários etc. pagam tanto quanto qualquer outro, mas pode ser que não tenham número ou organização suficiente para eleger um representante seu. Como fica então? Será que, por ter maior poder político, aquele grupo que se organizou pode usar os recursos tirados de todos para fins que lhes dêem vantagem? Será que é justo que eles usem o Estado para interferir nas liberdades do segundo grupo?
É aí que se encontra o dilema da democracia em uma sociedade livre – respeitar os direitos de todos, e ao mesmo tempo garantir que os governantes passem por uma substituição periódica, mantendo-os subordinados à vontade da população. Como evitar que grupos de interesse monopolizem o governo, prejudicando outros em favor próprio? A única solução para esse problema, que não passe pela anarquia, é a solidez das instituições: em qualquer constituição deve estar bem especificado o papel do Estado e dos representantes eleitos. O respeito a essas regras deve ser dever de todos, e as violações punidas exemplarmente.
A Constituição brasileira, elogiada pela imensa maioria dos acadêmicos e políticos brasileiros, é um autêntico livro de terror para um liberal, pois atribui ao Estado um número enorme de responsabilidades “politicamente corretas” bastante genéricas, e que dão amplo espaço para distribuição desigual de impostos da maneira que mais agradar aos representantes.
Portanto, como se não bastassem os problemas inerentes à democracia representativa, entre os quais se destacam a corrupção e o uso de poder em benefício próprio, a própria estrutura do sistema de governo democrático-representativo brasileiro dá margem para que os representantes usem o dinheiro público como eles – ou suas bases de apoio – bem entenderem.
A maior necessidade do Brasil neste momento é uma profunda reforma estrutural, que dê mais espaço para o indivíduo exercer seus direitos e menos poder ao Estado e seus agentes para decidir os rumos da vida nacional. Novamente, devemos lembrar que os nossos governantes são empregados e não patrões – eles foram eleitos por um certo grupo de cidadãos, mas são subordinados à toda a sociedade, e portanto devem servir a ela como um todo. Afinal, como dizia um tal de James Bovard: “Democracia deve ser alguma coisa mais do que dois lobos e um cordeiro votando o que comer no jantar.”