domingo, agosto 12, 2007

As Crias do Comunismo

O século XX foi marcado por grandes eventos, cada um deles causado pelo anterior. Nessa era de mudanças, um período que se destacou foi a Guerra Fria. Conseqüência direta do fim das grandes guerras, a Guerra Fria foi protagonizada pelas duas grandes potências da época: Estados Unidos e União Soviética. Os Estados Unidos era um país que mantinha um regime democrático havia séculos, no qual as pessoas manifestavam seus interesses pela voz dos políticos. Em contrapartida, a União Soviética fora criada no século XX, resultado de um conturbado processo político no qual o Estado passou a concentrar todos os poderes, negando representação à maioria de seus habitantes. Foi um período negro na história de muitos russos, e ainda hoje vários relutam em lembrar esse passado, mesmo que infelizmente ainda existam muitos outros que gostariam de voltar ao passado soviético. Durante a Guerra Fria, ambas potências competiam por influência ao redor do globo com todas as armas que dispunham, o que resultou na “conversão” de alguns países tipicamente capitalistas em socialistas, e na popularização da ideologia comunista ao redor do globo. Mas o regime soviético da Rússia não conseguiu viver sob seu próprio projeto econômico, e acabou sendo forçado a fazer reformas que iam contra sua ideologia, culminando com seu próprio fim, em 1991.

Hoje vivemos uma nova era, na qual o medo não impera. Mas a União Soviética deixou suas crias pelo mundo, na forma de partidos de extrema esquerda, regimes agressivos e autocráticos, jurássicos movimentos “revolucionários”, e toda a ideologia antiglobalização e antiprogresso que é passada à juventude logo nas escolas. Tudo isso sobrevive com base numa paranóia que põe arreios nas pessoas que seguem tais ideologias. A idéia deste texto é justamente provar que essa ideologia não faz mais sentido nos tempos atuais, se é que um dia chegou a fazer sentido.

Dentre os regimes que tiveram origem no comunismo soviético, Cuba é um dos mais clássicos. Cuba é uma ilha no Caribe que sofreu uma revolução no final dos anos 50, e que foi posteriormente influenciada pelos ideais socialistas soviéticos, já nos anos 60. Desde então, Castro e seus comparsas arrastaram Cuba por uma longa jornada rumo à estupidez, estatizando a grande maioria das empresas e condenando ao paredón várias pessoas acusadas de “trair” o movimento; tal repressão eventualmente levou à formação da comunidade de refugiados cubanos na Flórida.

Por volta dos anos 70, Canadá e México quebraram o embargo contra Cuba, alegando tentar incentivar o liberalismo em Cuba, continuando com o intercâmbio cultural e econômico de outrora, mas de nada adiantou, pois a cúpula comunista não desiste do poder do mesmo jeito que um cão não larga seu osso. Nos anos 90, com a queda da União Soviética, de quem Cuba dependia economicamente, Cuba passou por uma crise. O modelo que os inspirara acabava de ruir diante dos olhos do mundo inteiro, e eles afundavam em uma crise econômica. Mesmo assim, a cúpula não quer sair voluntariamente do poder, e continua com sua ideologia falha e seu regime autoritário; Cuba só têm a perder com isso. Para não deixar as pessoas esquecerem que eles estão no “caminho certo”, o regime faz sua propaganda, com base em investimentos ineficientes na área da educação e da saúde (áreas que seriam muito mais desenvolvidas num regime capitalista eficiente); e mesmo com toda a medicina cubana, o médico de Fidel é espanhol.Alguns cubanos estão dispostos a enfrentar uma verdadeira maratona para a liberdade, seja desertando uma competição esportiva em solo estrangeiro (como nos jogos pan-americanos deste ano), seja fazendo o decatlo rumo a Miami. E se o governo põe as mãos nesses “traidores do movimento”, aí eles estão com problemas. Que tipo de progresso é esse, onde as pessoas são coagidas a não sair de um país em ruínas pela força? Ainda assim o regime de Castro sobrevive, agora influenciando a próxima geração de populistas latino-americanos, esta mais hipócrita que a anterior.

Um de seus maiores expoentes é o presidente venezuelano Hugo Chávez. Depois de seguir carreira como oficial do exército, fundou um movimento esquerdista após a sua fracassada tentativa de dar um golpe de estado e foi eleito presidente em 1998. Durante seu mandato suas principais medidas foram para modificar a máquina eleitoral de modo que ele permanecesse no poder por mais tempo. Com todo o tempo do mundo para fazer sua “revolução”, Chávez começou por estatizar os setores básicos da economia, como alimentos e energia. No setor de alimentos criou sua própria grande empresa de alimentos e perecíveis (Mercal), que ele usa para divulgar sua imagem e seus feitos produzidos. A competição desleal desta empresa, que conta com o apoio do estado e das leis, arruinou a classe média venezuelana que tinha pequenos negócios locais, tirando do povo o poder político e agora o econômico atrelando todo o povo venezuelano ao governo. Com a população dependente do governo, Chávez tem total poder sobre as decisões a ser tomadas com respeito à Venezuela, e reforça esse poder com mecanismos legais para ir prolongando indefinidamente sua estadia na presidência.

No setor de energia ele nacionalizou o gás e o petróleo, se apossando de recursos pertencentes ao povo venezuelano (e não ao estado), usando o dinheiro desses recursos para expandir sua influência no mundo financiando a dívida argentina, fazendo doações a minorias nos Estados Unidos, dentre outras “ações humanitárias”, que visam acima de tudo angariar apoio à causa chavista (lhe valendo a alcunha de “cafetão do petróleo”, pelo New York Times). E o pior é que esse investimento é praticamente o único que está dando retorno: alguns “intelectuais” no exterior dão seu apoio ao chavismo e acabam influenciando lá mesmo as novas gerações que ainda estão formando sua opinião, mesmo sem ter idéia do que se passa na Venezuela, fomentando assim, a conivência internacional.

A censura à imprensa é pesada. Chávez criou estatais da imprensa que não têm outra função senão informar às pessoas o que ele quer que elas saibam, e as outras quatro redes de televisão privadas sofrem com regulamentações autoritárias, como a “lei de responsabilidade social”, que é um bonito nome para censura, nua e crua. Quem criticar oficiais venezuelanos pode ser preso por até 40 meses segundo um decreto de 2005. Quando questionado se ele tinha a intenção de usar esse mecanismo contra as críticas da imprensa privada (na qual ele ainda não conseguiu por as mãos), ele disse que não ligava para o que ela dizia, e citou Dom Quixote “Se os cães ladram, é porque estamos trabalhando”. Independentemente da intenção dessa resposta, disso podemos tirar uma boa metáfora: o mesmo Dom Quixote que se jogou contra um moinho pensando que era um gigante é a inspiração para Hugo Chávez que se joga contra a globalização.Como o moinho, a globalização é produtiva e beneficia a todos em uma sociedade. Como Don Quixote, Chávez acredita piamente que está certo em seus devaneios, cego por sua própria vontade. Ele recusa-se a desistir de um modelo econômico e político que já falhou anteriormente em outros lugares. Em outras palavras, está louco como o personagem de Cervantes.Em 2006, Chávez decidiu não renovar a licença de uma das redes de televisão privadas, acusando-a de suportar causas golpistas.A Freedom House, associação internacional que mede o nível de liberdade de imprensa, baixou o nível da Venezuela de parcialmente livre para não livre. Com a imprensa em uma mão e a máquina legislativa em outra, Chávez consolida ainda mais seu poder, planejando reformas que garantam sua reeleição em 2012. O que incomoda mais é que essa revolução bolivariana mal teria sucesso se não fosse pelo petróleo e seus preços em ascensão. Chávez tomou o petróleo e usou-o para financiar suas aventuras políticas e sociais que tornam o povo dependente do estado ao invés de fazer reformas liberais que dêem independência econômica ao povo venezuelano. E ele ainda critica o Brasil na questão dos biocombustíveis, acusando-nos de compactuar com o demônio (Bush, no ideário chavista), uma grande hipocrisia de sua parte, porque ele sabe que os biocombustíveis vão competir com o petróleo, tirando bons dólares da reserva de Chávez e prejudicando sua agenda política.

Outro populista radical na América Latina é o cocaleiro Evo Morales, que usa os hidrocarbonetos da Bolívia como arma política da mesma maneira que Chávez usa o petróleo, o que nos remete à demonstração boliviana de soberania ao usar soldados do exército para expulsar os brasileiros das instalações da Petrobrás que ele nacionalizou. Nacionalizar já é uma quebra de contrato e portanto um ato desrespeitoso, mas usar o exército para intimidar os funcionários pode ser entendido diplomaticamente como um insulto. Morales chegou ao poder liderando o movimento dos cocaleros, que são contra os esforços para a erradicação do plantio da folha de coca, que garantiram o apoio popular. Agora ele é apenas mais um peão de Castro na política latino-americana, juntamente com o presidente do Equador há pouco tempo eleito (certamente com ajuda dos vizinhos vermelhos), Rafael Correa. Castro disse no forum marxista em São Paulo há algum tempo que pretendia reconstruir na América Latina o que foi perdido na Europa Oriental. O que foi perdido lá não faz falta nenhuma; os anos de repressão à liberdade econômica e de expressão são um passado negro da Europa Oriental, e os poloneses, ucranianos, russos, eslavos, dentre outros povos, certamente concordam. É esse tipo de coisa que os espectadores de fora deviam ver antes de dar seu apoio ao primeiro revolucionário que aparecer.

E quanto à ideologia por trás dessas aberrações políticas? Como já foi dito, todas tem origem no comunismo, o que é provado pelo vasto número de partidos comunistas mundo afora. Suas reivindicações costumam seguir a linha marxista original, especialmente em países latinos. Para eles o estado é o melhor instrumento para equilibrar o nível de vida das pessoas, mas eles não enxergam o quão corrupto um estado se torna quando tem em mãos um grande montante de capital; na verdade muitas medidas de equilíbrio de renda são apenas medidas para tornar as pessoas dependentes do governo, como vimos no caso da Venezuela. O estado deveria intervir apenas em casos graves, como cartéis, monopólios e fraudes. Mas para a esquerda latina, vale a máxima de Maquiavel: “Os fins justificam os meios”; o estado tudo pode enquanto as intenções forem boas, ou pelo menos enquanto o povo achar que são.

Tal ideologia acaba unindo vários setores opostos à globalização, como ocorre no Brasil: sindicatos de trabalhadores, movimentos rurais e associações estudantis são usados como ferramentas para avançar a causa esquerdista ao invés de exercerem suas funções originais (defender os direitos de suas respectivas classes). Em épocas de governos de direita, opõem-se às mudanças com medo de perder seus benefícios; em épocas de governos de esquerda, fazem pressão no governo para ganhar mais benefícios. São parasitas que desviam recursos produzidos por todos nós para seus interesses mesquinhos. A esquerda latina não consegue mais encontrar lugar num mundo globalizado, e insiste em manter ideais que arruinaram vários países durante a Guerra Fria. Esta é a hora de a esquerda se modernizar, abandonando esses ideais e se tornando mais pragmática, como lentamente ocorreu na Europa durante o pós-guerra. Se a esquerda não aceitar e se adaptar à globalização, ela simplesmente não vai ter lugar neste século XXI.